23 semanas
Este diário virtual tem sido a minha terapia ao longo destes meses, confesso que não tenho feito psicoterapia desde o 1° trimestre, não posso dizer que é puramente por razões económicas apesar de que é um grande factor porém o meu psicólogo já se disponibilizou a dar me consultas praticamente de borla, no entanto é algo que eu realmente não me sinto a vontade, respeito muito o trabalho dele e o seu tempo para sequer ter coragem em aproveitar me a esse ponto.
Já disse aqui que a gravidez pode se tornar numa fase da vida bastante solitária mesmo tendo todo o apoio do mundo, sinto coisas que as pessoas a minha volta não sentem e nem conseguem compreender o que se passa. O facto de relativizar os dilemas de alguém que para além de ter problemas psicológicos por natureza e que durante a gestação vão intensificando desencoraja muito a dar abertura para falar do que nos preocupa.
A medida que o tempo passa vou me apercebendo que a maternidade será o grande desafio da minha vida principalmente por mexer a um nível extremo com a parte emocional de uma mulher bipolar que por consequência afecta a nivel fisico.
Insisto muito em falar no assunto porque é algo que me assusta. O pós parto é difícil para qualquer mulher, a fase do purperio (tema que ainda estou a aprender) é muito muito delicado, então o que dirá para uma pessoa com transtorno bipolar com grandes probabilidades de ter episódios de psicose e longos períodos de depressão?
Quero muito ser capaz de cuidar e proteger a criança que estou a gerar e as vezes dou por mim a pensar que não vou ser capaz, e não estou a falar disto de um lugar onde a depressão com que estou neste momento esteja a deixar me apreensiva porque sei que eventualmente vai passar, mas sim da lucidez de conhecimento das inúmeras possibilidades de como poderá correr.
As estatísticas e estudos que existem deixam números preocupantes para mulheres que se encontram na minha posição.
Nasci e cresci numa família disfuncional e tóxica, e desde nova soube que não era isso que queria para o meu filho, sempre tive o sonho de ter uma família que pudesse chamar de minha e ter uma criança feliz e saudável mas a verdade é que até agora eu própria não tenho conseguido essa estabilidade emocional necessária para concretizar esse sonho.
É claro que no que depender de mim darei o meu melhor para ter uma criança feliz, mas tenho consciência de que as coisas nem sempre correm como idealizamos, mas questiono me até que ponto vou ter essa força, como será se eu não me sentir capaz?
Tenho a sorte de ter um homem, que vai ser um excelente pai sim, mas eu quero ser uma boa mãe, quero ser capaz de estar presente nos momentos importantes da vida do meu filho, desde a nascença até onde a vida me permitir.
Os estudos são deveras desanimadores, mais de 90% das mulheres com transtorno bipolar desenvolvem ou depressão severa, no melhor dos cenários ou, episódios psicóticos onde é necessário haver internamento, nos dois casos acaba por haver um afastamento da mãe no início da vida do bebé e eu sei o impacto negativo que isso tem na vida de uma criança ainda que seja um bebé que pode não entender o que se está a passar mas a ideia de abandono vai ficar para sempre no subconsciente dele...
Antes de engravidar não tinha a mínima noção destas informações e honestamente mesmo que tivesse iria querer ser mãe a mesma, mas talvez tivesse feito as coisas de outra forma. O facto de ter interrompido o tratamento durante a gravidez tem sido um fator negativo para a minha saúde e estou a tentar lidar com as consequências, sei que só me resta ter paciência e tentar sempre fazer as coisas pelo melhor na esperança de que tudo irá correr da melhor maneira possível mas não consigo dar nada por garantido nesse aspecto e isso tem me consumido por dentro.
Talvez todo este medo seja super natural e até algo saudável mas a maternidade que na minha opinião começa desde que há um coração a bater no meu ventre, traz medos que me deixam sem chão nos dias menos bons.
Gostava de ser como essas super mulheres que ultrapassam qualquer coisa pelos filhos, mas antes de mãe, sou um ser humano com limitações, então são dois pensamentos contraditórios.
Vejo que as pessoas a minha volta pouco ou nada entendem do transtorno bipolar por mais que tente "educar" alguém a respeito e para a maior parte das pessoas o que realmente interessa é a saúde do bebé, esquecendo o facto que para haver um bebé saudável tem que haver uma mãe equilibrada e o apoio nesse sentido sinto que será quase nulo...
A informação, educação e auto conhecimento tem me ajudado muito a entender a minha condição e respeitar tanto o meu corpo quanto a minha mente, mas é muito mais fácil encontrar estas informações sobre pessoas bipolares do que sobre o transtorno bipolar na gestação e pós parto, nas minhas pesquisas e em busca por informação aprendi que há 15% de probabilidade de passar este transtorno para o bebé geneticamente.
Não é o fim do mundo, há formas de atrasar ao máximo o desenvolvimento da doença na vida da criança/adulto e mesmo que venha a ter, estando informada é mais fácil identificar sintomas que nos permitam agir de forma rápida para que tenha uma vida mais normal possível, mas eu não desejo isso para o meu filho, não só pelo transtorno em si mas também porque não é nada fácil viver numa sociedade desinformada sobre este tipo de condição e o estigma pode vir a trazer processos dolorosos.
No geral, hoje sinto me muito cansada e desanimada, talvez isso não ajude na questão do pensamento algo negativo, mas sem dúvida que escrever sobre as minhas preocupações ajuda me a tentar encontrar formas de lidar com possíveis situações que podem ou não vir a acontecer futuramente.
São temas sensíveis e muito complexos que precisam ser bem entendidos para evitar o pior dos cenários, tanto na minha saúde como na saúde do bebé/criança/adulto da pessoa mais importante da minha vida.
Mas são poucas as pessoas que fazem parte da nossa rede de apoio que estão dispostas a educarem se sobre este assunto, o que me entristece.
Quando um bebé vem ao mundo toda gente quer saber do bebé, quer pegar, sentir a ternura, ou ate "ajudar" mas como alguém pode ajudar sem se informar da real situação de toda a familia?
Todos querem saber do bebé, ninguém se importa com a mãe ou até o pai que para além das preocupações e responsabilidades também pode vir a ter uma experiência desgastante numa situação destas.
Se realmente existe alguma preocupação, deve existir empatia e compreensão se não em vez de ajudar, esta rede de apoio pode se tornar inútil numa fase tão vulnerável para todos.
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